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II

Alguém falou em irmos tomar um copo. Tipo, um brinde à memória de Simone. Não sei se deva ir, estou com uma dor de cabeça de estalar e afinal já acabou tudo, brindes, brindes para quê?
Mas não quero ser um chato nem desmancha-prazeres e todos os que querem ir conhecíam-na bem. Não vão cumprir nenhuma tradição nem fazer mais ou alguma coisa diferente do que fizeram quando ela estava viva.
Claro que ninguém a conhece como eu. Conhecía. Nunca me vou habituar à idéia de que já não vai voltar. Que merda.
Talvez não deva ir, vou acabar por me atrapalhar quando se falar dela, é lógico que acabemos a falar dela e muito provavelmente de uma maneira triste fazendo-a parecer sórdida através do alcool que já tivermos ingerido, alguns hão-de chorar.
Eu hei-de escapar-me para a casa-de-banho se sentir que vou chegar a esse extremo. Ela detestava gente chorona, de uma forma ou de outra achava-os ridiculos e fracos e algumas vezes assisti a uma satirização cruel das suas vitimas nos seus piores momentos.
Ou melhores, agora já não sei.
Acho que deixei de saber de tudo.
Achamos que tudo está controlado, garantido, previsível e de um momento para o outro... Simone morre. Puf! Como um ar que não se vê.
Merda.
Acho que preciso mesmo de um copo para me animar.
Mas não vou falar de Simone, limito-me a ouvi-los e a abanar a cabeça. Mesmo que digam coisas que não sejam verdade não vou desmenti-los.
A verdade sei-a eu, ninguém sabe de Simone como eu.

1 comentário:

augusto, um entre mil disse...

pois é, há alturas que nos sentimos perdidos e não sabemos já se sabemos alguma coisa. alturas há em que as certezas se foram e já só temos dúvidas.

e a verdade, essa por vezes julgamos conhecê-la. mas não, nem sobre nós próprios.